Em Além do Bem e do Mal, Nietzsche traz à tona uma severa crítica à sociedade. Ele destaca que os homens, absortos pela moral cristã, reúnem-se como um rebanho e buscam unicamente a igualdade, impedindo assim que qualquer crítica às suas ações se presentifique em meio ao coeso grupo. De acordo com Nietzsche, o homem de rebanho vive na ausência de pensamento próprio e assim reproduz ideias vulgares, vive no empobrecimento cultural e capitaneia a corrupção.
Por viver sem padrões próprios, o homem de rebanho nietzschiano estaria sempre subjugado pela referência do grupo ao qual pertence, ou seja, ele precisaria da opinião dos outros membros de seu grupo para legitimar o que ele pensa de si mesmo. Na perspectiva de Nietzsche, o homem de rebanho só sobreviveria na unanimidade. Desse modo, podemos pensar que quando Nelson Rodrigues cunhou sua famosa frase: “toda unanimidade é burra”, talvez ele tenha se inspirado em Nietzsche. O fato é que observando o pensamento nietzschiano podemos dizer que ele, muito antes de Nelson Rodrigues, já chamava a unanimidade de burra e já definia o homem de rebanho como um ser incapaz de agir livremente.
Na perspectiva política, as massas e o homem de rebanho podem sim representar uma arbitrariedade fadada à igualdade, e esse fato per si já provoca a tessitura de inúmeras críticas. Entretanto, não se pode negar que o homem é um ser gregário, ele busca a união grupal inclusive porque sua química corporal o impele a isso. Cientistas já descreveram que a ocitocina, também chamada de química do amor, tem papel fundamental no gregarismo humano. Quanto maior a produção de ocitocina no organismo humano, maior a confiança depositada pelo indivíduo em quem está ao seu redor e mais intensa é a sensação de recompensa por pertencer àquele determinado grupo e também por repetir os comportamentos comuns a ele.
Considerando-se as duas vertentes: a política e a psicofarmacológica, devemos compreender que maior que a cegueira ideológica, a unanimidade e o sentimento de grupo podem também ser encaradas como inerentes à natureza humana e talvez até mesmo como uma forma de subsistência. Não há que se negar que os indivíduos sentem prazer, segurança e bem-estar na igualdade de seu grupo. Mesmo aqueles que apontam a unanimidade como um equívoco também compõem um rebanho que se reúne em torno de sua própria unanimidade. Assim, de rebanho em rebanho, cada unanimidade pode ser encarada como burra em seu encerramento e também como a salvação de seus componentes.
Observando esses dois lados, só um sinal se evidencia: nada é absoluto, muito menos a unanimidade.
Margarete Schmidt, sócia da Innovare Pesquisa de Mercado e Opinião e gestora dos projetos qualitativos da empresa, é autora desse texto, exclusivo para o Blog da Innovare.
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