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GASTRONOMIA EM 5 SENTIDOS

Se engana quem acha que a experiência culinária é só gustativa. Até mesmo os americanos, tão adeptos do fast-food, ao comer um Big Mac buscam mais do que o gosto dos 2 hambúrgueres, alface, queijo, molho especial, cebola e picles num pão com gergelim. O prazer deles também está em comer com as mãos, lamber os dedos, sentir aquele cheiro gorduroso, ouvir a crocância da batata… E, felizmente, estas experiências podem ser muito mais intensas e inovadoras.

Na última semana foi anunciada em Londres a prestigiosa lista dos 50 melhores restaurantes do mundo segundo a revista inglesa Restaurant. Desde 2002 a revista publica este ranking, considerado por muitos um farol que aponta os rumos que a gastronomia mundial está tomando. O grande vencedor do último ano é o catalão El Celler de Can Roca, que vinha ocupando o segundo lugar da lista nos últimos dois anos. Esta ascensão não significa necessariamente que o trabalho realizado pelos irmãos Roca tenha melhorado significativamente no último ano, mas sim que as tendências por eles defendidas se tornaram mais relevantes. E eles defendem o compromisso com uma criatividade que homenageia a tradição, um equilíbrio entre a vanguarda, a ciência, a memória e a tradição.

São inúmeros os restaurantes, muitos até presentes na lista de melhores do mundo, adeptos de uma cozinha moderna, criativa. O que destaca os irmãos Roca é justamente ultrapassar essa barreira, sempre em busca de inovações. Eles não se prendem à busca por novos usos para ingredientes tradicionais, novas formas de cocção, e  diferentes formas de apresentar uma receita clássica. Fazem uso da cozinha molecular, com suas texturas que surpreendem o tato além do paladar. Mas não se prendem às técnicas moleculares. O uso de perfumes em sua cozinha é um claro exemplo disso. Paladar e olfato estão extremamente associados e assim o aroma de um perfume traz ao prato um sabor que não poderia ser alcançado apenas com técnicas e ingredientes usuais. Ao criarem pratos inspirados em fragrâncias famosas, eles brincam com a memória olfativa de seus clientes através de experiências gustativas.

Dando continuidade à busca por uma cozinha que estimule todos os sentidos, os irmãos criam novas experiências gastronômicas e confirmam sua veia inovadora. Estreou ontem a ópera gastronômica “El Somni” (O Sonho), idealizada pelos irmãos Roca. A ópera trata da existência humana através de temas familiares como amor, guerra e morte, em uma abordagem nada tradicional. Composta por 12 atos, são servidos 12 pratos harmonizados a 12 vinhos, acompanhados por apresentações audiovisuais projetadas sobre a mesa. Com este projeto, nas palavras de Jordi Roca, eles ousaram fechar os olhos para perder referências e então reabri-los em uma cozinha cheia de possibilidades.

União de imagem, matéria, música, sabor e aroma, a gastro-ópera expressa a curiosidade e criatividade destes irmãos. Através dela, buscam compartilhar com outras pessoas de mente aberta, numa via de mão dupla, todo esse potencial criativo que ultrapassa os limites da simples alimentação. Serão convidados pensadores com os mais diversos pontos de vista para participar de tal experiência: cientistas, atores, músicos, designers, jovens de todo o mundo, de todas as áreas do conhecimento e da cultura. O objetivo é compartilhar valores e amplificá-los, criando momentos de pura beleza enquanto adquirem ferramentas para propósitos sociais, culturais e educacionais. Ao final das 12 apresentações planejadas, que acontecerão em 12 cidades ao redor do mundo, estão previstos o lançamento de um livro e de um documentário que com certeza mudarão o que entendemos hoje por gastronomia.

*Paulo Savaget, sócio da Innovare Pesquisa de Mercado e Opinião e responsável pelos projetos de inovação e sustentabilidade da empresa, e Juliana Chagas, farmacêutica que trabalha com gastronomia e patisserie,  são autores desse texto, exclusivo para o Sem Escala.

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