É espantoso para o suposto ambiente democrático brasileiro o Projeto de Lei aprovado pela Câmara, fortemente patrocinado pelo Governo, que restringe a criação de novos partidos políticos. Sem acesso aos fundos partidários e com a alteração da regra de acesso ao tempo de televisão, o Planalto, caso o Projeto passe no Senado, terá condenado à morte a candidatura de Marina Silva.
O Projeto teve sua tramitação suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal. Em sua decisão, Gilmar Mendes afirmou: “A aprovação do projeto de lei em exame significará o tratamento desigual de parlamentares e partidos políticos em uma mesma legislatura. Essa interferência seria ofensiva à lealdade da concorrência democrática, afigurando-se casuística e direcionada a atores políticos específicos”. Mais uma vez o STF é chamado e piora a já tão frágil relação entre os dois poderes.
Mesmo tendo a possibilidade objetiva de se reeleger com grande folga, ainda em primeiro turno, o Governo não quer correr qualquer tipo de risco, mesmo que, para isso, tenha que lançar mão de expedientes autoritários e pouco republicanos. É uma iniciativa antipática, pelo menos para os verdadeiros democratas, e que terá preço a ser pago.
Além de tudo o que já foi dito sobre o assunto, temos de nos perguntar: quais são as razões, os verdadeiros motivos para uma empreitada como essa? Do que o PT tem medo?
Algumas são imagináveis e prováveis:
Em primeiro lugar, ao inviabilizar a candidatura de Marina Silva, o governo vislumbra maior probabilidade de vitória no primeiro turno. Assim, o governo, com o auxílio e servidão do PMDB, pretende simplesmente retirar da disputa o atual segundo colocado.
Em segundo lugar, o PT e o Governo temem a formação de uma nova liderança política. Apesar de já ter sido testada nas urnas em 2010, Marina Silva, com 20 milhões de votos, ficou em terceiro lugar e provocou um segundo turno entre Dilma e José Serra.
Marina ainda será “o novo” na eleição de 2014. Em 2010 mais da metade dos eleitores brasileiros não elegeram Dilma em primeiro turno, e agora, sem José Serra no páreo, o desempenho de Marina Silva pode ser ainda melhor. O PT conhece a história de candidatos ao cargo de Presidente da República, que por várias vezes são derrotados e acabam se elegendo. Marina mostra ao PT um certo déjà-vu, uma sensação de que esse cenário e essa trajetória são conhecidos e vivenciados.
O que é ainda mais importante: tudo o que o PT não quer, em hipótese alguma, é enfrentar um concorrente parecido com aquilo que ele foi um dia. Ao olhar pelo retrovisor, o PT vê Marina Silva como uma candidata que poderá fazer uma campanha baseada em interesses mais nobres, com presença de militância engajada e com paixão. Ela poderá, com a propriedade de ter sido uma figura ilustre do partido, discutir com profundidade os descaminhos do PT.
Manobras eleitoreiras como essas não são novas. Em 1999, no Governo Fernando Henrique, o Senado fez um grande esforço para a aprovação da cláusula de barreira, que reduzia expressivamente o número de partidos.
O que o PT e o PMDB querem com essa nova restrição à criação de novos partidos é ainda mais autoritário. Não consta que em 2011, o ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, tenha recebido o mesmo tipo de tratamento do Governo por ocasião da criação do PSD. Foi diferente, ele é da base aliada. Aos amigos tudo; aos inimigos uma nova lei!
A nossa expectativa é a de que os senadores se inspirem no Senador Eduardo Suplicy, que ao votar contra o pedido de urgência da Emenda, se “recusou a trair a sua consciência”.
*Milton Marques, consultor da Innovare Pesquisa para projetos de opinião pública, é autor desse texto, exclusivo para o Sem Escala.
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