Em evento recente para anunciantes do YouTube, Eric Schmidt, diretor do Google, foi questionado sobre o possível deslocamento de espectadores da TV para o canal de vídeos mais popular na internet. A resposta foi categórica: segundo Schmidt, o deslocamento já aconteceu.
Dados divulgados pela própria Empresa indicam que a maioria dos jovens entre 18 e 34 anos assiste a mais conteúdo do YouTube do que o de qualquer canal a cabo. Robert Kyncl, diretor global de conteúdo da plataforma de streaming de vídeos, ainda deu mais duas declarações relevantes sobre o YouTube e o pensar contemporâneo da comunicação. A primeira é que a TV é uma via de mão única, enquanto o YouTube responde muito claramente. Claro que as coisas já mudaram um pouco, e os canais de televisão não são mais tão fechados quanto eram antes, mas as possibilidades de resposta em uma plataforma on-line são muito mais fáceis e imediatas, o que promove maior abertura.
Kyncl ainda afirma que, enquanto o negócio da TV é o alcance de espectadores, o do YouTube é o engajamento. A audiência de um vídeo no ambiente digital não é medida apenas pelo número de pessoas que viram aquele conteúdo, mas também pelo número de compartilhamentos, comentários, pelo poder viral e vários outros fatores.
Voltando à fala de Schmidt, é interessante ressaltar que o Google encara o bilhão de acessos únicos mensais do YouTube como um número pequeno, especialmente quando se considera a população mundial e os países de terceiro mundo. O recado foi para aguardarmos o dia em que esse número subirá para seis ou sete bilhões.
O deslocamento de espectadores de produtos audiovisuais para fora da TV vem acontecendo há algum tempo, e são inúmeras as plataformas de conteúdo on-line. Serviços como o Netflix também vêm modificando a forma como assistimos à TV. As grandes emissoras correm atrás e tentam levar o conteúdo para a internet, mas ainda são poucas as que entenderam que a linguagem do ambiente digital é diferente daquela já explorada por elas.
Fora do Brasil, já é possível perceber mais claramente os esforços pelo engajamento de usuários web pelas grandes produtoras de conteúdo, e o caminho encontrado acaba passando por ideias de transmedia storytelling. De acordo com Henry Jenkins – pesquisador que cunhou o termo -, “uma história transmídia se desdobra através de múltiplas plataformas de mídia, cada qual com um novo texto, fazendo uma contribuição distinta e valiosa para o todo”. Logo, as emissoras estão tentando criar uma audiência digital que não invalide aquela que já têm na televisão. A essência do processo transmídia é justamente esta: fazer uma história ser complementar à outra e enriquecer, assim, a narrativa principal. Exemplos claros desse tipo de estratégia podem ser encontrados nos seriados Heroes (vale ler essa entrevista com Tim Kring, criador da série), How I Met Your Mother e, para citar um exemplo brasileiro, o Mothern, da GNT.
No entanto, o que dizem o Google e YouTube com suas últimas declarações é que a migração será mais radical: pode ser que estejamos no início de um processo no qual a programação da TV vai deixar de fazer parte do conteúdo consumido pelos usuários web.
A minha opinião é a de que isso pode acontecer, mas a mudança ainda demora. Muito do que procuramos na internet ainda é o conteúdo das emissoras de televisão que, por alguma razão – da falta de tempo à impaciência em relação aos intervalos comerciais – perdemos. A internet ainda vive mais de serviços on demand do que de conteúdo original. Quando mais passos em direção do conteúdo original forem dados, é bem provável que a história mude.
*Vinícius Calijorne trabalha com conteúdo digital, é estudante de Cinema e Publicidade e é autor desse texto, exclusivo para o Sem Escala.
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